Apuração das eleições para pessoas ansiosas

Ontem finalmente terminaram as eleições de 2022. Eu até pensei em fazer um post aqui sobre usabilidade e arquitetura da informação das telas da urna eletrônica, mas acabei não fazendo: as imagens da urna no site simulador do TSE ficam com uma faixa azul por cima, daí fica ruim de printar a tela, não fica igual à urna real, enfim, desisti. Eu poderia ter procurado as imagens das telas direitinho, mas no fim, achei que o material não daria uma análise muito interessante e deixei pra lá.

Ontem de manhã, dia do segundo turno, recebi o link para um site chamado “Apuração para pessoas ansiosas”, com a proposta de ser:

Uma visão simplificada da apuração!
Para você, que não aguenta
mais esperar o resultado das eleições.

Me identifiquei e usei a ferramenta para acompanhar o resultado. Esse, sim, me pareceu um caso interessante para analisar e escrever alguma coisa aqui 🙂

O projeto é super simples: pegar os dados do TSE, em tempo real durante a apuração do resultado das eleições, e mostrar, de uma forma visualmente simples e fácil. De um jeito que a pessoa só bate o olho e já entende o que está acontecendo, sem precisar pensar muito.

E, bom, é exatamente isso que se espera de um ambiente informacional: que as pessoas entendam a informação contida ali, sem muito esforço. O conteúdo do ambiente era o mesmo que estava nos portais de notícias e no próprio aplicativo do TSE, fonte original dos dados. O que muda é a forma como esse conteúdo é apresentado, mostrando que a forma como as informações estão organizadas e sua visualização, fazem toda a diferença.

Então, seguem algumas observações sobre a arquitetura da informação (AI) e as visualizações de dados usadas no site:

  • O conteúdo está todo em uma página só, não é necessário nenhum clique (apenas rolar a página). Isso elimina a necessidade de um sistema de navegação complexo, em que a pessoa precisa tomar decisões sobre qual o próximo passo, para onde ir/onde clicar para encontrar mais informações. A navegação é linear e só tem um caminho: é só rolar a página para baixo. Sem a necessidade de tomar decisões, já que o caminho é um só, o gasto cognitivo é menor, e também a ansiedade;
  • Há poucos conteúdos, ou seja, não traz informação irrelevante e que faria a pessoa perder tempo lendo e ficando mais ansiosa;
  • Com poucos conteúdos, também é mais fácil e mais rápido encontrar a informação desejada;
  • Vai direto ao ponto: quantos % e número de votos para cada candidato e qual o % de urnas apuradas. A atualização foi automática e síncrona com o TSE;
  • Uma informação extra, mas que gostei de ver, foi o número de votos recebidos por cada candidato no primeiro turno, em que a barra foi crescendo conforme a apuração. Com isso, dava para ver se estava chegando ao mesmo número da finalização do primeiro turno e comparar. Ter uma base de comparação é importante para a compreensão da informação, ajudando a diminuir da ansiedade.
  • Os elementos visuais também fazem parte da AI e auxiliam na compreensão da informação. A paleta de cores simples, com poucas variedades e usando tons associados aos candidatos, também foi acertada. A tipografia em letras grandes para as informações principais utilizou bem o tamanho da fonte como elemento de hierarquia de informação;
  • A parte mais complexa do site é uma visualização do tipo tree map com os estados, em que, quanto maior a população do estado, maior o retângulo no gráfico. Durante a apuração, mostrou o % apurado em cada estado, informação que também me deixou menos ansiosa (no primeiro turno eu fiquei abrindo várias abas para saber como estava o andamento em cada estado, um caos 😵‍💫);
  • Ainda sobre essa visualização, uma observação interessante: dados geográficos quase sempre são representados em imagens de mapas, como visto nos vários portais de notícias e canais de TV para mostrar a apuração dos resultados. E, quase sempre, a informação geográfica fica bem representada com o uso de mapas. Mas nesse caso do resultado das eleições, não! Primeiro porque o tamanho do território dos estados não tem relação diretamente proporcional à população e, consequentemente, ao número de eleitores. Segundo que, mesmo que essa proporção existisse, os formatos diversos dos estados dificulta a comparação. Olhando o mapa, qual é maior, Rio Grande do Sul ou Paraná? Já a representação em formatos similares, de retângulos, facilita essa comparação visual.
recorte do tree map de estados

Ao final da página, colocaram uma previsão feita com base para no resultado do primeiro turno e no andamento da apuração do segundo, com a probabilidade de um dos candidatos ser eleito – não considero essa parte como uma informação essencial, mas foi legal para quebrar a tensão, com uso de textos leves e engraçados. Além de ter provavelmente ajudado na ansiedade das pessoas que se apegam muito aos números e modelos matemáticos!

Richard Wurman, arquiteto responsável pela criação do termo Arquitetura da informação e autor do livro “Ansiedade da informação”, fala que o antídoto para a ansiedade é o acesso. Ele explica que:

Para cada caso, a acessibilidade torna-se possível pela descoberta de uma estrutura específica – a forma de organização mais correta e mais simples – para um assunto específico, que permite aos leitores encontrar o que lhes interessa, sem sentir culpa por ignorar o que não interessa.

Bom, essa foi uma primeira análise, que pretendo aprofundar em um estudo mais acadêmico em breve. A princípio, parece que a equipe Fehra, responsável por essa ferramenta para acompanhar o resultado das eleições, acertou no antídoto. Parabéns aos criadores! 🙂

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